sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Portugal: Estado Novo

Óscar Carmona
Introdução:
Em Portugal, a democracia personificada na forma de República não obteve bons resultados. Desde 1911 até à entrada na 1ª Guerra sofreu com as incursões monárquicas mas o pior ainda estava para vir. Com o fim da guerra, Portugal sofreu com a regressão do demo-liberalismo, à semelhança de outros países na Europa. As graves condições económicas (inflação, desvalorização da moeda e défice elevado) e sociais (carestia de vida, miséria, desemprego, greves) aliadas às ideias bolchevistas que provinham da Rússia levaram a uma grande agitação social. A população começa a adoptar os ideais extremistas quer de esquerda quer de direita.
No nosso país, a opção por um regime de direita foi facilitada uma vez que os republicanos haviam perdido todo o seu crédito quer pelas divisões internas do partido quer pela sua incapacidade de resolução dos problemas.
No dia 28 de Maio de 1926 foi levado a cabo um golpe militar pelo General Gomes da Costa, que contou com o apoio do país católico, conservador e agrícola já que todos estes desejavam a ordem e um Governo forte. Fechou-se o parlamento e instituiu-se a ditadura militar. Apesar das suas pretensões, os primeiros meses foram conturbados porque a administração não conseguiu resolver as dificuldades económicas herdadas da 1ª República.

António de Oliveira Salaza
Entrada de Salazar na governação:
O general Gomes da Costa acaba por ser destituído e Óscar Carmona substitui-o. Em 1928 inicia-se a ditadura nacional com a entrada de António de Oliveira Salazar, professor de Economia na Universidade de Coimbra, no governo através do Ministério das Finanças. Este aceita o cargo sob um conjunto de condições, nomeadamente, a superioridade do Ministério das Finanças em relação aos outros com o poder de veto sobre quaisquer decisões que envolvam o aumento ou a redução da dívida pública. Como ministro das Finanças obtêm resultados muito positivos a nível financeiro e toma um conjunto de medidas que têm em vista a constituição de um “Estado forte”. Em 1930, cria a União Nacional e promulga o Acto Colonial, dos quais falarei mais à frente. Em 1932 passa a chefiar o governo.
Um ano mais tarde publica a Constituição de 1933 que é sujeita a plebiscito e é aprovada. Institui-se o Estado Novo, uma forma de governo construído à imagem do fascismo italiano mas com características próprias relativas à própria personalidade do ditador português como, por exemplo, o conservadorismo. Salazar contou com o apoio de todos aqueles que haviam sido abalados pela primeira República, assim, tem ao seu lado grupos como a Igreja e todos os católicos, a alta burguesia, as classes médias e baixas que haviam sido asfixiadas, os monárquicos, os militares e, claro, todos os que apoiavam o ideário fascista.



Características do regime:
Pode-se afirmar que o Estado Novo era, essencialmente conservador, nacionalista, antidemocrático e corporativo.
Podemos analisar o conservadorismo de Salazar recuando ao seu passado. Mal terminou o ensino primário ingressou no Seminário de Viseu durante 8 anos e em 1917 criou o Centro Católico Português. Havendo levado uma vida regrada repleta de certos valores religiosos vai desejar o mesmo para o seu país. Assim, o carácter conservador do regime traduz-se na valorização de Deus, Pátria, Família, Hierarquia e Moralidade que constituem alguns dos exemplos daquilo que era considerada “a educação nacional”. Criticava-se a vida citadina e as actividades como a indústria atribuindo-se valor ao mundo rural e á agricultura. Há uma união com a religião católica que passa a ser considerada a religião do regime. A família devia ser estruturada de forma a que o pai trabalhador seja respeitado, a mulher doméstica se reduza á gestão do lar e os filhos sejam obedientes e exemplares.


Há, também, um nacionalismo exacerbado, o qual podemos observar nas palavras de Salazar: “Tudo pela Nação, nada contra a Nação”. Procede-se á glorificação de todos os feitos portugueses e de todas as figuras marcantes da nossa história. Os conteúdos aprendidos na escola eram manipulados sendo que o que era narrado só ilustrava os acontecimentos da forma que melhor conviesse ao Estado. Salazar sentia-se orgulhoso da diferença que existia entre o regime português e o italiano. Não apoiava as demonstrações exageradas dos líderes europeus, pelo contrário, prezava a integridade e a moralidade.



Em terceiro lugar podemos afirmar que é antidemocrático, antiparlamentar, antiliberal. A Nação passa a ser olhada como um todo, cujos sacrifícios individuais serão em prol dela mesma. Considera, ainda, que as maiores falhas políticas da República foram a grande divisão partidária e a superioridade do poder Legislativo que levou à queda  de sucessivos governos. Salazar assume-se como opositor feroz da democracia parlamentar e valoriza o poder Executivo que considera ser o garante de um Estado forte.
Podemos observá-lo num discurso que pronunciou em 1930: “Não há Estado forte onde o Poder Executivo o não é, e o enfraquecimento deste é a característica geral dos regimes políticos dominados pelo liberalismo individualista ou socialista, pelo espírito partidário e pelos excessos e desordens do parlamentarismo. (…) É uma necessidade fundamental (…) achar o sistema que dê ao Poder Executivo independência, estabilidade, prestígio e força.”

Assembleia Nacional

Assim, na Constituição de 1933 ficam expressos os três órgãos fundamentais do regime, o Presidente da República, o Presidente do Conselho, função que Salazar ocupa e a Assembleia Nacional que não é dotada de grandes poderes. O Presidente da República e o do Conselho governam conjuntamente, apoiam as decisões um do outro, partilham poderes, facto que levou á referência da governação portuguesa como “presidencialismo bicéfalo”. Salazar é visto como o "chefe incontestado, o salvador da pátria”, ou seja pratica-se o culto do chefe.


É um regime que defende o corporativismo, ou seja, a associação de pessoas, que partilham os mesmos lugares na sociedade, em corporações controladas pelo governo. O corporativismo vai abranger o campo político, social e económico. As corporações eram, por exemplo, universidades, agremiações desportivas, Casas do Povo, Sindicatos Nacionais, etc. As corporações elegiam os municípios que enviariam os seus delegados á Câmara Corporativa, que por sua vez tinha o poder de opinar sobre projectos de lei.

Como não podia faltar neste tipo de regime um controlo das massas, criou-se um conjunto de estruturas que auxiliaram no controlo da população. O Secretariado da Propaganda Nacional vai ter um papel importante na manipulação da arte a favor da publicitação do regime. A União Nacional foi o partido único português à semelhança do nacional fascista na Itália. O seu objectivo era de transmitir aos seus afiliados o espírito da nação, da união, da valorização histórica, etc. Da mesma forma que as ditaduras fascistas tinham milícias, Portugal também as teve mas num contexto de enquadramento das massas e não de violência. A Legião Portuguesa chegou a contar com milhares de membros e a ser obrigatória para certos empregos públicos. A Mocidade Portuguesa destinava-se às crianças que frequentavam o ensino primário e secundário, onde se pretendia impingir os valores do regime. O ensino foi, também, controlado sendo que os manuais foram adaptados pelo regime e recheados da doutrina cristã. Os professores que não apoiavam o regime deixaram de poder exercer a sua profissão. Criou-se, por fim, a FNAT (Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho), que tinha como objectivo a ocupação do tempo livre dos trabalhadores com actividades direccionadas à aprendizagem dos valores do regime.




Uma das outras maneiras de controlar a vida do país garantindo a sobrevivência da ditadura foi a criação de um forte aparelho repressivo. Todos os filmes, jornais, peças de teatro e televisão passavam pela censura prévia do “Lápis Azul” que impedia a difusão de ideias que abalassem os fundamentos do regime. A par da censura desenvolveu-se uma polícia política que prendia, matava e torturava opositores ao regime, principalmente, militantes do Partido Comunista Português. Inicialmente era denominada por Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE) mas passou a Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE). Esta dispunha de uma vasta rede de informadores, que denunciariam comportamentos suspeitos. Isto provoca o terror e o medo dentro da população pois aqueles que eram denunciados eram presos em locais como o Tarrafal em Cabo Verde e a prisão de Peniche.


Campo de concentração do Tarrafal em Cabo Verde
Intervenção económica:
Salazar chegara ao poder numa altura coincidente com uma grave crise económica. Portanto era natural que se esperasse que ele conseguisse melhorar a situação do país. Este acaba por recuperar a economia do país e atingir a estabilidade financeira. Tem como base da sua política intervencionista o modelo autárcico utilizado na ditadura fascista.

Num discurso em 1928 conseguimos perceber um pouco sobre as suas intenções: “Advoguei sempre a política do simples bom senso contra a dos grandiosos, tão grandiosos e tão vastos que toda a energia se gastava em admirá-los, faltando-nos as forças para a sua execução. Advoguei sempre uma política de administração, tão clara e tão simples como a pode fazer qualquer boa dona de casa – politica comezinha e modesta que consiste em se gastar bem o que se possui e não se despender mais do que os próprios recursos.”



Salazar começa por prestar atenção à estabilidade financeira do país pois considera que só assim poderá reformular outros sectores económicos. A sua prioridade era a diminuição da dívida pública que só conseguiria através da diminuição das despesas e aumento das receitas. Leva a cabo uma política de austeridade que concretizou através da implementação de um conjunto de impostos, da melhor administração dos dinheiros públicos e do aumento das pautas alfandegárias sobre as importações, o que reduziu a dependência externa. O facto de Portugal não ter participado na 2ª Guerra Mundial foi favorável á economia visto que não só poupou com as despesas que uma guerra oferece como também saiu favorecido pela exportação de volfrâmio. Conseguiu o aumento do ouro nos cofres do Estado e a moeda não sofreu tantas flutuações como havia sofrido em tempos anteriores.


Uma vez que havia atingido o seu objectivo dirigiu a sua atenção para a agricultura. Como já vimos, Salazar defendeu o mundo rural e tudo o que nele se podia desenvolver. Logo, vai proceder a um conjunto de alterações, nomeadamente, a fixação de população no interior do país através da Junta de Colonização Interna, a arborização de terrenos e a estimulação agrícola. Incentivou a produção das exportações preferencialmente portuguesas, tais como o vinho, a cortiça, a fruta, o azeite, etc. Tal como Mussolini, Salazar levou a cabo a promoção de Campanhas, a da Fruta e a mais importante a do Trigo que decorreu entre 1929 e 1937. A última foi decididamente a mais significativa pois levou ao alargamento da área de cultivo deste cereal, á proteção dos agricultores através da aquisição das suas produções e da protecção alfandegária. Nesta altura, Portugal atinge a auto-suficiência, que só termina com o inicio da 2ª Guerra Mundial.


O desejo de seguir os modelos de autarcia, que garantiam a auto-suficiência, adviera de dois factores: o contexto da Grande Depressão e a necessidade de permeabilizar a economia ás crises cíclicas; a necessidade de fazer sobreviver o regime, pois uma vez que dependesse economicamente de outrem podia ser forçado a liberalizar a sua política.

Eng.º Duarte Pacheco
A sua atenção voltou a ser redireccionada uma vez que os seus objectivos para a agricultura estavam a ser cumpridos. Desta vez foram as obras públicas que mereceram a sua atenção. Tendo como Ministro das Obras Públicas o Eng.º Duarte Pacheco, Salazar procedeu á modernização do país, que também contribuiu para a diminuição do desemprego.
 Privilegia a criação de um mercado interno e externo, para os quais desenvolve as linhas de ferro, actualiza os portos, constrói aeroportos e cria e desenvolve as auto-estradas, que ligam o Norte ao Sul e o Litoral ao Interior. Moderniza as redes telegráficas e de telefone, procede á construção de mais barragens que melhoraram a irrigação dos solos para a agricultura, expandiu a electrificação e construiu mais um conjunto de estruturas como escolas, tribunais, hospitais, etc.

Tendo dado valor a outros sectores económicos, não fez o mesmo pelo industrial. Entre 1931 e 1937 levou a cabo uma política de condicionamento industrial. Esta traduziu-se na limitação do nº de empresas existentes, do equipamento utilizado, da produção, entre outras. O controlo industrial foi apenas uma forma de Salazar evitar a superprodução, a queda dos preços, o desemprego, ou seja, pretendia evitar uma crise cíclica de superprodução, típica de uma sociedade capitalista.
Ponte da Arrábida - um dos marcos do regime


A corporativização sindical:
A livre-associação sindical deixou de ser permitida pois era considerada perigosa ao regime. Em 1933 é publicado o Estatuto do Trabalho Nacional que determinava que todos os trabalhadores (excepto os da Função Pública) se tinham que associar em sindicatos nacionais e os patrões em grémios. Estes discutiam, entre si, contratos de trabalho, normas e cotas de produção, preços e salários sob a supervisão do Estado. Salazar pretendia evitar a concorrência nos mercados e pretendia assegurar o direito ao trabalho e ao salário pelo que proibiu as greves. A aniquilação dos sindicatos livres levou a algumas manifestações que foram imediatamente reprimidas.

Forças repressoras do Estado após a Revolta contra a
 interdição dos sindicatos livres.

Política Colonial:
Como já havia referido, Salazar publica o Acto Colonial em 1930 onde se defende a posse dos territórios ultramarinos através da justificação de uma função histórica de civilizar os indígenas. A propaganda levada a cabo dava a entender que era legítimo tirar proveito das colónias pois as populações só beneficiariam da presença dos portugueses. Assim, passou-se a considerar superior a metrópole, que podia requisitar matérias-primas às colónias e, ainda utilizá-las como mercado de escoamento. Provocou-se na população um certo fanatismo imperial, como se Portugal fosse o senhor do Mundo.

Propaganda alusiva á Política Colonial

“Política do Espírito”:
António Ferro
A cultura e as expressões culturais são o resultado dos estados de espírito dos artistas que podiam, porventura, atentar contra os ideais do regime. Tornou-se necessário fazer um controlo mais apertado das produções culturais pelo que se levou a cabo um projecto globalizante denominado de “Política do Espírito”. Esta pretendia a utilização dos artistas como meio de disseminação dos ideais do Estado Novo. Esta política foi levada a cabo pelo Secretariado da Propaganda Nacional chefiado por António Ferro, um conceituado jornalista e editor da revista Orpheu. Procedeu á mediatização do regime tendo como influência os resultados positivos obtidos pela propaganda na Itália de Mussolini.

Pretende-se enaltecer, nas obras, o amor pela pátria, o culto dos heróis passados, a família, a confiança no progresso, ou seja, os ideais conservadores. Contudo, esperava-se que a técnica fosse mais actualizada do que os ideais, pelo que se confiou na vanguarda artística que foi o modernismo. Começou por ser apoiar a literatura mas a adesão dos escritores foi fraca e as obras que se valorizava eram do período Romântico. Prestou-se apoio às artes plásticas, à arquitectura, ao cinema e ao rádio, que era representado pela Emissora Nacional. António Ferro deu, ainda, atenção à cultura popular como as romarias, os arraiais, as feiras, etc. Promoveram-se exposições como a do Mundo Português em 1940, onde diversos pavilhões aludiam á História de Portugal: conquistas, cultura, tradições, etc. Apesar da grande prosperidade inicial, António Ferro acaba por abandonar o seu posto em 1949, após o fim das ditaduras europeias em 1945, que abalaram o regime.

A porta da Fundação
Entrada da Exposição do Mundo Português - 1940

Salazar fica no poder até 1968 quando tem que se afastar após ter um problema de saúde. Marcello Caetano é chamado ao poder por Américo Tomás, o Presidente da República de então. Salazar morre em 1970 e a ditadura termina 4 anos mais tarde a 25 de Abril de 1974 com a famosa Revolução dos Cravos.



Trabalho realizado por: Beatriz Pacheco


Fontes: 
Manual adoptado: "O tempo da história" - Porto Editora
Guia de estudo - Porto Editora
"História de Portugal" - Cículo de Leitores

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